Panorama geral do trabalho aos domingos no Brasil – Leitura jurídica e perspectivas

PARECER JURÍDICO

Assunto: Análise jurídica analítica e perspectivas reflexas da questão do trabalho dominical no Brasil.

Solicitante: Confederação Nacional do Turismo – CNTUR e Associação Brasileira de Bares e Casas Noturnas – ABRABAR.

1. RELATÓRIO

Faz-se o presente documento em caráter orientativo às entidades solicitantes para fins de deslumbrar o contexto, as implicações e a atual posição do ordenamento jurídico pátrio no que diz respeito ao específico assunto do trabalho aos domingos no Brasil, como este se enquadra perante a lei trabalhista pátria e quais são as perspectivas sugeríveis e esperáveis de uma mais fundamentada regulamentação de sua prática.

Diante do fato, procede-se com a análise.

É o relatório.

2. CONTEXTO HISTÓRICO

A abordagem do trabalho dominical necessariamente suscita menção à colocação histórica e social deste dia da semana, vez que sua condição dentro do cerne cultural da sociedade brasileira é a única e exclusiva motivação pela qual se discute a licitude da exigência laboral no primeiro dia de cada semana.

Etimologicamente, o domingo deriva do latim dies Dominicus, ou dia do Senhor, em alusão direta à orientação clériga cristã que permeia a fundação da sociedade brasileira. Sua guarda deriva culturalmente do Cânon 29 do Concílio da Laodicéia, do ano de 364 d.C, que ainda à época do Império Romano – novamente, fonte inspiradora das instituições e da organização social ocidental da qual o Brasil faz parte – instruiu ser o domingo um dia de guarda, de cessação dos trabalhos e de descanso do povo cristão. Assim institui sua cláusula dominical:

“Que no venerável dia do sol os magistrados e as pessoas residentes nas cidades descansem, e que todas as oficinas, estejam fechadas, No campo ainda assim que as pessoas ocupadas na agricultura possam livremente continuar seus afazeres pois pode acontecer que qualquer outro dia não seja apto para a plantação de vinhas ou de sementes…”

Faça-se nota que “dia do sol” é a nominação de origem pagã do dia de domingo.

A origem histórica da guarda do dia de domingo, portanto, é afeta a uma herança cultural dos tempos do Império Romano cristão, de regulação – arbitrária – dos preceitos de organização religiosa de sua sociedade, e não uma interpretação de escrituras sagradas que lhe embasavam a religião de fato.

Notoriamente, pela própria conformação histórica das sociedades ocidentais, em especial as latinas, como o Brasil, a incorporação de conceitos romanos e de conceitos cristãos da época de profusão desta fé terminou por trazer a sacralidade do dia dominical à crença da população, mas sem necessariamente desnudar a origem mais mundana – e menos teológica – do motivo pelo qual este dia era guardado.

Como um costume, por inércia, este princípio de guarda dominical remanesceu. Por sua vez, como regra geral de ser a origem do direito e a formação das leis uma derivação das observações dos fatos costumeiros praticados por um povo, a guarda dos domingos acabou sendo incorporada em diversos documentos legislativos e normativos ao longo da história, como positivação de uma prática popular e costume socialmente aceito.

Todavia, a prática do descanso dominical não é de uma origem sacra e tão pouco sua violação em condições de necessidade – ou mesmo por conveniência – representa ofensa história a qualquer preceito religioso cristão bíblico.

Aliás, neste particular, ressalte-se que a tradição judaico-cristã endereça ao dia de sábado – o shabbath hebraico – a qualidade da sacralidade, de guarda. Conta com expressas menções na própria Bíblia cristã, mais especificamente no Livro do Êxodo, que assim dispõe: “Lembra-te do dia do sábado para santificá-lo. (…) O sétimo dia, porém, é o sábado de Iaweh teu Deus. (…) …, mas repousou no sétimo dia; por isso Iaweh abençoou o dia do sábado e o consagrou.” (Êx 20.8-11).

O terceiro mandamento das tábuas trazidas por Moisés também apontam na cultura do cristianismo a guarda do sábado, ou sétimo dia, considerando ser o domingo o primeiro dia da semana.

Logo, poderíamos concluir de uma análise histórico-cultural que a sacralidade dominical seria, de fato, equivocada sob o prisma da cultura cristã, pois foi o sábado o dia consagrado por Deus nos textos sagrados. No entanto, percebemos da leitura do ordenamento jurídico brasileiro de hoje que não há reservas a este dia por conta de sua conotação cultural sagrada. Do contrário, é tido por dia em que o labor é incontestemente lícito, talvez excetuando-se por convenção em categorias profissionais muito ímpares, cuja existência é mesmo insabida por esta relatoria, e também na excepcional condição dos cristãos Adventistas e de algumas vertentes da ortodoxia judaica, mas quanto a estes não por lei.

Parece dissociada a ideia de preservação do trabalho aos domingos da razão tradicional da cultura cristã conformadora da nação brasileira, pois o sábado é solenemente ignorado por seu ordenamento jurídico, ainda que para esta mesma cultura cristã (e mesmo para a judaica) seja este o dia de relevância sagrada, e não o dominical.

Em dias de hoje, em que o Estado Brasileiro se faz laico (art. 5º, VI, da CRFB/88), e em que, ainda que de maioria cristã, a sociedade do Brasil se mostra plúrima e não-uniforme em suas crenças e religiosidades, muitas delas não-cristãs, o contexto histórico pelo qual se traz a figura do domingo como dia de repouso por excelência parece-nos esmaecer ainda mais. Pouco guarda de relação com o próprio cristianismo neste sentido e menos ainda como imperativo organizacional de nossa sociedade.

À luz do jugo frio do tecnicismo orientador da redação legislativa, a preservação de uma regra de repouso dominical não se justificaria.

3. DO TRABALHO AOS DOMINGOS NA LEI ATUAL

A matéria trabalhista brasileira é regulada em sua iteração moderna pela Consolidação das Leis Trabalhistas, já septuagenária. Em seu Capítulo II, Seção III – Dos Períodos de Descanso – cuida de estabelecer que o repouso devido, semanal, deverá coincidir com o dia de domingo, no todo ou em parte (art. 67, caput, da CLT), de forma geral.

A mesma lei ainda prescreve uma série de condicionantes para o trabalho dominical, seja pela necessária natureza de conveniência ou imperatividade do serviço, seja pela necessária imposição de revezamento dos trabalhadores para lhes oportunizar o repouso dominical e seja pela prévia autorização da autoridade competente a autorizar os estabelecimentos a assim proceder (arts. 67, § único e 68, caput e § único, todos da CLT).

Tratando de setores e profissionais mais específicos, a CLT também abordou a questão do trabalho aos domingos de forma mais branda, como é no caso dos empregados nos serviços de telefonia, de telegrafia submarina e subfluvial, de radiotelegrafia e radiotelefonia, aos quais prevê trabalho aos domingos, feriados e dias santos desde que seja tal labor considerado extraordinário, remunerado como tal (art. 227, §2º, da CLT). O mesmo se faz para os marinheiros e navegantes.

Para os jornalistas, obrigou repouso ao domingo excetuada apenas a condição de existência de acordo escrito em contrário (art. 307 da CLT). Professores, por sua vez, são expressamente proibidos de lecionar aos domingos (art. 319 da CLT).

Quando tratou das normas especiais protetivas ao trabalho da mulher, a CLT cuidou de repisar o que já delineou de forma geral em seu artigo 67, permitindo-o desde que por imperiosa necessidade do serviço prestado e mediante escalas de revezamento e conforme o acatamento da autoridade competente (arts. 385 e 386 da CLT).

Ainda de forma contemporânea a CLT se encontra a Lei 605/49, que em seu artigo 1º dispõe ser o descanso semanal devido preferencialmente – e não obrigatoriamente – aos domingos. O Decreto 27.048, que regulamenta tal lei, apenas estabeleceu imposição de incidência de DSR dominical, conforme escala, a cada sete semanas de trabalho (de modo que, em regimes de trabalho de 5 x 1 – cinco dias de labor para um de repouso – haja incidência matemática do repouso em dia de domingo em ao menos uma vez a cada sete semanas).

Em suma, o que observamos é um esforço legislativo pela preservação do descanso aos domingos, no entanto, de forma majoritária, permeando esta vedação nos casos em que a imperatividade, proeminência e necessidade do serviço nestes dias de domingo for tal que justifique-se a quebra da regra (isto conforme apenas a CLT, que fique claro).

A Constituição Federal de 1988, promulgada de forma posterior à existência da CLT (e que a recepcionou, como inconteste perante todas as Cortes pátrias), deteve redação aberta neste particular, sem proibir o trabalho aos domingos mas igualmente sem lhe tornar franco e irrestrito, utilizando o cuidadosamente cunhado termo “preferencialmente” ao se referir à incidência do descanso semanal nos dias de domingo. É o que permite verificar a leitura do artigo 7º, XV, da CRFB/88:

XV – repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;

As legislações laborais correlatas pós-Constituição de 1988 proliferam uma lógica legislativa pré-constitucional mitigada, a saber na figura, por exemplo, da Lei 10.101/2000, que facultou o trabalho dominical ao setor do comércio, desde que respeitada a escala de um domingo de repouso para cada três laborados (art. 6º, § único, da referida lei), sem condicionantes fiscalizatórios ou de demonstração de imperiosa necessidade do setor.

Logo, a diretriz econômica de necessidade da prática do labor dominical é plenamente admitida pela lei, inclusive a celetista, reconhecendo-se que na dicotomia entre a garantia trabalhista ao repouso e a necessidade premente da execução de certos serviços em dias de domingo deve-se pender em favor da segunda sempre que necessário, observada a presença de certos mecanismos de fiscalização e de compensação da maior penosidade atribuída ao trabalho nos dias de domingo.

A lógica da imperatividade econômica na análise do trabalho dominical se perpetua em compasso com a progressão temporal da edição das normas que tratam do tema, fazendo fácil notar que o avanço legislativo gradualmente desfaz a sacralidade histórica do repouso dominical em favor dos arranjos econômicos hodiernos, que não se apresentam compatíveis com uma lógica legislativa pautada no panorama social de mais de setenta anos atrás.

As escolhas legislativas feitas lecionam que a atividade laborativa em uma sociedade de crescente dinamismo não pode acatar – sem incontável prejuízo – a aplicação do anacronismo de normas que já não descrevem mais sua realidade, e eis o motivo pelo qual a lei, como fato jurídico, deve necessariamente sofrer atualização ao sabor dos anseios da sociedade que rege. Não para menos que a CLT, ao longo de sua existência, sofreu e vem sofrendo constantes atualizações, de modo que hoje é em muitos pontos irreconhecível perante sua iteração originária.

Em síntese podemos observar que o trabalho aos domingos é possibilitado, porém não sem rigorosas condicionantes na maioria dos setores (vide regra geral do artigo 67 da CLT).

À margem da análise focada apenas na lei estrita, a recepção da matéria pelo Poder Judiciário revela notável abrandamento das condições previstas na legislação para o trabalho realizado aos domingos. O entendimento dos juízes trabalhistas e dos Tribunais da Justiça Especializada apontam no sentido da mitigação dos requisitos legais para que o trabalho em domingos seja tido por permissível e adequado. A mesma lógica, que não necessariamente se reflete nas ações de fiscalização pelas autoridades competentes, pode ser demonstrada no teor da Súmula de n.º 146 do Tribunal Superior do Trabalho:

Súmula nº 146 do TST TRABALHO EM DOMINGOS E FERIADOS, NÃO COMPENSADO (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 93 da SBDI-1) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

O trabalho prestado em domingos e feriados, não compensado, deve ser pago em dobro, sem prejuízo da remuneração relativa ao repouso semanal.

Vemos que a entidade máxima na resolução das questões laborais pátrias não se preocupou em condicionar a validade dos trabalhos dominicais e em feriados aos elementos trazidos pela CLT, mas apenas em lançar que o mecanismo de compensação do trabalho prestado em tais dias é válido, ou seja, que a fungibilidade do trabalho em domingos por folga noutros dias do módulo semanal se aplica.

Por sua vez, Tribunais pátrios detém predileção interpretativa pelos termos da Lei 605/49 e artigo 7º, XV, da Constituição Federal, para justificar que não é impositiva a incidência dos repousos aos domingos, mas facultativa. Vejamos decisão do TST neste sentido:

TRABALHO AOS DOMINGOS. DESCANSO SEMANAL. SISTEMA 5X1. COMPENSAÇÃO. Nos termos do artigo 7º, inciso XV, da Constituição Federal, o repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos, é direito assegurado a todos os trabalhadores urbanos e rurais. A Lei nº 605/1949, tal qual a Constituição Federal, prevê, no artigo 1º, a concessão do repouso semanal remunerado, de forma preferencial, aos domingos: -Art. 1.º Todo empregado tem direito ao repouso semanal remunerado de vinte e quatro horas consecutivas, preferentemente aos domingos e, nos limites das exigências técnicas das empresas, nos feriados civis e religiosos, de acordo com a tradição do local. – Por sua vez, o artigo 67 da CLT assegura idêntico direito aos trabalhadores, preconizando que o descanso semanal deva ser de vinte e quatro horas consecutivas. E o parágrafo único do referido diploma legal determina que, nos serviços que exijam trabalho aos domingos, com exceção de elencos teatrais, será estabelecida escala de revezamento, mensalmente organizada; enquanto o Decreto 27.048, de 12 de agosto de 1949, que aprova o regulamento da Lei 605/49 (art. 6º, §2º), bem como o artigo 2º, alínea b, da Portaria nº 417, de 10 de junho de 1966, estabelecem que, nos serviços que exijam trabalho em domingo, com exceção dos elencos teatrais e congêneres, será criada uma escala de revezamento, previamente organizada e constante de quadro sujeito à fiscalização, a fim de que, pelo menos em um período máximo de sete semanas de trabalho, cada empregado usufrua pelo menos um domingo de folga. Observa-se, ainda, que nem a Constituição Federal nem a lei que instituiu o repouso semanal remunerado exigem que o repouso recaia, necessariamente, nos domingos, uma vez que o legislador fez uso da expressão – preferencialmente-. Ademais, constata-se que, ante a realização de escala no regime 5×1, o eventual trabalho em domingo era devidamente compensado, motivo pelo qual a decisão recorrida se encontra em perfeita consonância com a Súmula nº 146 do TST: – O trabalho prestado em domingos e feriados, não compensado, deve ser pago em dobro, sem prejuízo da remuneração relativa ao repouso semanal. – Ante o exposto, o recurso encontra óbice no §5º do artigo 896 da CLT, que impede seu conhecimento. Recurso de revista não conhecido. (…) (RR – 125400-84.2008.5.09.0093, Relator Min. José Roberto Freire Pimenta, Julgamento em 10/09/2014, 2ª Turma, DEJT 19/09/2014).

A prática revela que, na análise dos pressupostos de validade do trabalho aos domingos, a justeza do sistema compensatório prevalece sobre requisitos de teor burocrático e muitas vezes impreciso, não se demonstrando imprescindível o rito do cumprimento de requisitos que não revelam, na prática, incompatibilidade com a justeza do sistema compensatório.

Reconhece-se que não há afetação ao direito prático do trabalhador ao repouso, especialmente nos termos que trata a Constituição Federal, diploma máximo ao tratar do direito em comento.

Todavia, remanescem as implicações administrativas pois, conforme consignado no próprio artigo 67 da CLT e legislação correlata, os quadros organizacionais de escala e as motivações empresariais para imposição de labor aos domingos remanescem como objeto de fiscalização e, consequentemente, de multas administrativas por seu descumprimento.

Vemos, assim, aparente conflito entre a função finalística da norma de repouso dominical e sua efetiva redação. Se por um lado o Poder Judiciário vem reconhecendo reiteramente que a satisfação do direito se faz com a compensação do domingo trabalhado com folga em outro dia do mesmo módulo semanal – e isto dentro dos critérios de equidade, razoabilidade e ampla dilação para a comprovação da efetiva necessidade de serviços em tal dia – por outro a letra fria da Lei não confere qualquer dinamismo interpretativo que permita adequar a função teleológica da norma à sua finalidade prática.

Há inegável cenário dúbio, que prevê punição para fins de descumprimento da norma não em caráter individual, dentro da esfera dos direitos do trabalhador – o que de fato interessa e justifica a própria existência da Lei – mas em caráter administrativo apenas, tornando a regra, na prática, autopoiética e prejudicial para, especialmente, os pequenos empresários que detém um custo proporcional muito mais alto a fim de atender os preceitos burocráticos da legislação e por vezes sem condição de estabelecer uma escala de revezamento, pois seu parco quadro funcional não o permite.

4. PANORAMAS E DESDOBRAMENTOS

 

O trabalho aos domingos permanece sendo, em regra, permitido apenas em situações excepcionais, nos casos onde a própria Lei reconhece por padrão o premente interesse público no desenvolvimento de certos trabalhos e atividades, ou para categorias profissionais que, por um motivo ou outro, entende-se ser o caráter prioritário de descanso aos domingos destituído de sua prevalência por outros motivos diversos.

Estas manifestações intencionais dos legisladores que criaram – e que mantém – as regras da proibição ou vedação do trabalho aos domingos, no entanto, têm encontrado certa resistência crítica por parte dos setores da sociedade focados no desembaraço econômico que o franqueamento das escalas com trabalho dominical traria.

Os entendimentos do Judiciário neste particular, que tendem a rejeitar de maneira bastante incisiva a inaplicabilidade do trabalho nos dias de domingo desde que haja a compensação da folga ou paga respectiva de tais horas com adicional, revela um reflexo de interesse de mudança de rumos no que diz respeito a esta particularidade na organização dos arranjos laborativos. É um sinal claro de que a regra necessita de revisão.

Não para menos, a sociedade de hoje detém uma organização econômica muito mais dinâmica do que aquela vista na década de 40 (edição da norma celetista), na qual, diga-se, o imaginário trabalhista era inundado quase que exclusivamente pelos modelos fabris e de trabalhos repetitivos, no qual a CLT se inspirou perceptivelmente.

As condições de trabalho, as alterações em especial no setor de serviços, os hábitos de consumo dos brasileiros e a própria necessidade de uma equalização mais eficiente no delicado equilíbrio de suprimento das demandas produtivas dita hoje ritmo não mais acompanhado pela pena do legislador que enxergou e criou regras para um Brasil de quase um século atrás.

Também não se vislumbra a existência, com a manutenção de mesmos estandartes regulatórios, da participação muito mais contundente de micro e pequenos empresários na composição do mercado produtivo brasileiro de hoje do que na época em que as leis celetárias foram confeccionadas. Em enorme número, especialmente graças a um geist hodierno que preza pelo espírito de empreendedorismo, os detentores de pequenas empresas sofrem enormemente com a satisfação dos requisitos burocráticos de normas pensadas para serem vivenciadas por companhias sensivelmente mais bojudas.

Estas mesmas amarras burocráticas geram uma percepção de salto exponencial na dificuldade de gerenciar questões diárias na gestão do empreendimento de pequeno porte. Senão levando à precarização de seu funcionamento pura e simples, por certo tais amarras terminam por incutir dúvidas no imaginário do empresário que prefere deixar de arriscar, de dar asas à evolução natural de seu empreendimento, por medo das consequências de um ordenamento que não se reveste de uma segurança jurídica convidativa e impõe hercúleos requisitos que, muitas vezes, não detém uma finalidade prática válida ou socialmente aceitável.

Hoje, uma autuação administrativa por descumprimento das exigências legalmente elencadas para realização do trabalho aos domingos pode ser suficiente a diferenciar a possibilidade de subsistência de um negócio ou sua inviabilização; ao menos, cogitável crer que crescer sob este risco impõe um temor desestimulante ao empreendedor, ainda que, na prática, a situação do ponto de vista dos direitos e garantias a seus trabalhadores permaneçam idênticas caso tais burocracias fossem riscadas dos diplomas que lhe instituem, especialmente na esfera dos direitos individuais.

No mais, vê-se que a depender das dimensões de seus quadros funcionais, torna-se factualmente inviável ao empregador organizar escala de trabalho suficiente a satisfazer os revezamentos insculpidos em Lei. O resultado poderá ser um dia a menos de produção na semana, que além de cessar o lucro, incrementa os gastos, pois as despesas de aluguéis, taxas e demais insumos do negócio permanecerão incidentes. É um arroxo prático na capacidade de gerar proveitos, recolher impostos e circular bens, serviços e créditos monetários na economia pátria.

Os ditames políticos modernos, especialmente inaugurados na gestão de 2019 e mais especialmente ainda na esfera Federal, demonstram que a palavra de ordem é privilegiar a eficiência e o crescimento do arranjo produtivo e econômico. Neste cenário, as burocracias dispensáveis devem necessariamente ser extirpadas como uma gordura incompatível com as novas escolhas de diretrizes feitas ao futuro de nosso mercado; neste caso em especial, sem qualquer prejuízo prático aos trabalhadores, que permanecerão com suas escalas de trabalho imutadas. O viés do fato não se altera e, do contrário, costuma ser firmemente reconhecido e legitimado pelo Judiciário.

Por fim, e talvez como uma mensagem clara, é importante relembrar que o Constituinte nunca se opôs à flexibilização desta visão do labor dominical, de sua possibilidade plena, pois do contrário bastaria replicar a exata mesma inteligência do prévio artigo 67 da CLT no texto Constitucional ao invés de dedicar-se ao termo “preferivelmente” como fez constar no inciso XV do artigo 7º da Carta Magna. Não o fez, e a hermenêutica jurídica leciona que o silêncio na confecção das normas do ordenamento detém uma interpretação positiva, não meramente omissiva.

Embrenhando-se em um caráter opinativo bastante pautado especialmente pela experiência prática da execução material dos contratos de emprego, não vislumbramos motivos pelos quais deva haver qualquer receio nesta flexibilização. Não se mitigam direitos nesta seara, na troca por um incremento de pujança econômica, mas vê-se do contrário um mero desatar de nó frente a requisitos burocráticos que não mais harmonizam com a visão nacional de interesse tanto de empregadores quanto de trabalhadores.

5. CONCLUSÃO

Diante dos levantamentos supra, levamos a conhecimento da solicitante os elementos acima declinados, colocando-nos à disposição para prestarmos esclarecimentos suplementares.

 

É o que cumpre elucidar, SMJ.

Curitiba, 2 de julho de 2019.

CARLOS ZUCOLOTTO JUNIOR
OAB/PR 15.717

LEONARDO REICHMANN M. PINTO
OAB/PR 54.896

THIAGO BRUNO ZENI MARENDA
OAB/PR 67.944

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